COMUNIDADES

Jongo do Quilombo São José

HISTÓRIA

A comunidade do Quilombo São José fica no município de Valença/Rio de Janeiro, em meio a Serra da Beleza, com suas paisagens que fazem jus ao nome, há três horas do centro do Rio de Janeiro.

Visitar o Quilombo São José é uma viagem ao passado. O trabalho em conjunto na agricultura de subsistência, a crença religiosa da umbanda e do catolicismo, a sabedoria das ervas medicinais, o artesanato tradicional, as benzeduras, o Calango, o Terço de São Gonçalo e o Jongo fazem parte do cotidiano dos moradores do quilombo desde a chegada dos seus antepassados naquela fazenda por volta de 1850.

O grupo de cerca de 200 negros é a sétima geração de descendentes dos ex-escravos que, com a abolição da escravatura, lá permaneceram, construindo suas casas de adobe (tijolo de barro) cobertas de sapê no alto da serra, à beira de um córrego.

As gerações seguintes reforçaram os laços sanguíneos e de solidariedade, viveram a crise do café e viram sua substituição pelo milho e depois pelo gado. E ainda assim conseguiram permanecer, por mais de um século e meio, na mesma terra herdada por seus ancestrais do antigo proprietário da fazenda.

Por essas razões o Jongo de São José permaneceu intacto desde os tempos do Brasil Colonial.

Nessas terras, os negros de São José constituíram um núcleo religioso e cultural procurado não só pelos moradores das cidades próximas, mas de vários outros pontos do Brasil e do mundo que visitam a comunidade nos eventos que lá acontecem ao longo do ano.

As famílias do Quilombo assistiram a sucessivas gerações de herdeiros dessas terras adiarem a promessa de legalização da doação verbal feita pelo primeiro proprietário e, por décadas, resistiram às tentativas de expropriação de suas terras – como quando impediram que o velho jequitibá, que fica no alto do quilombo, fosse derrubado. Com seus mais de duzentos anos, a árvore representa para os moradores a antiguidade da sua relação com o território.

No dia 05 de abril de 1999 o Governo Federal reconheceu oficialmente a comunidade como “remanescente de quilombo”, abrindo caminho para a titulação de suas terras; o que, porém, demorou muito para acontecer.

Após o reconhecimento federal como quilombo, nos termos do art. 68 da CRFB, o então proprietário demitiu a maior parte dos quilombolas dos serviços agrícolas que aconteciam naquela terra, restringiu a área permitida para plantio, permitiu que o gado invadisse as lavouras de subsistência das senhoras idosas, destruindo as suas hortas comunitárias, e impediu que os moradores da comunidade transitassem livremente pela fazenda.

Tais restrições impostas pelo fazendeiro e a lentidão das autoridades federais na desapropriação do Quilombo levaram seus moradores a enfrentar graves dificuldades para sobreviver.

Em junho de 2000 seus moradores, sob a liderança do filho da Mãe Zeferina, Antônio do Nascimento Fernandes, o “Toninho Canecão”, fundaram a Associação da Comunidade Negra Remanescente de Quilombo São José da Serra, com o objetivo de intensificar a luta pela desapropriação de suas terras, o registro e divulgação dos seus patrimônios culturais e a implementação de projetos sociais locais visando a mudança da qualidade de vida de seus moradores.

Toninho Canecão era um líder nato, que dedicou sua vida integralmente para a comunidade onde nasceu. Seu trabalho político e social foi tão importante que Toninho foi eleito o primeiro vereador negro da história de Valença, distrito com mais da metade da população negra.

Somente uma década depois, em 2009, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou o interesse social nos imóveis abrangidos pelo Território Quilombola de São José da Serra, o que autorizou o INCRA a propor a ação judicial de desapropriação em face da empresa de agronegócio que possuía a titularidade das terras. Finalmente, após muitos anos de luta, em 2015 foi efetuada a desapropriação do território em favor do Quilombo, que recebeu do INCRA os devidos Certificados de Concessão de Uso de suas terras.

Graças à sua forte identidade cultural, sua religiosidade e união familiar, essa família conseguiu se manter como uma das comunidades mais bonitas do Brasil.

Embora as tradições culturais do Quilombo São José sejam um testemunho vivo da história do negro no Brasil, a maior riqueza dessa comunidade são as pessoas que ali vivem, donas de uma generosidade e pureza raras.

Mesmo com a migração de muitos jovens para comunidades de baixa-renda do Rio de Janeiro e de São Paulo em busca de estudo e de oportunidades de emprego, nos dias de festa todos os anos esses familiares distantes retornam para o Quilombo, quando, então, todos esses laços são revividos.

* Texto Marcos André Carvalho (originalmente escrito em 2004 e revisado em 2024)

SINCRETISMO RELIGIOSO

Os negros de São José desde sempre frequentam terreiros de umbanda e a igreja católica.

Há aproximadamente 30 anos, a saudosa Mãe Zeferina fundou no alto do Quilombo o Centro de Umbanda São Jorge Guerreiro e Caboclo Rompe Mata.

Há três décadas, comecei a sentir umas coisas estranhas no corpo e fiquei muito doente.

Nenhum médico conseguia resolver até que amigos me disseram que eu deveria procurar um terreiro de umbanda. Fiquei curada. “A partir daí, soube que era médium e percebi que podia ajudar meu povo espiritualmente”, explicou a mãe-de-santo Zeferina Fernandes do Nascimento, falecida em julho de 2003, sendo sucedida como líder espiritual do quilombo por sua filha Terezinha Nascimento, Mãe Tetê, falecida em junho de 2023, que, desde menina, acompanhou-a nas sessões de umbanda. Atualmente, quem comanda o terreiro é Maria da Paz.

Seu Manoel Seabra, o Tio Mané, irmão de Zeferina, também já falecido, sabia curar diversas doenças através de rezas antigas e benzeduras ensinadas pelos ancestrais africanos. Rezava quebranto, vento-virado, espinhela caída, e com as ervas medicinais do local curava diversas doenças e até mesmo picada de cobra.

Os moradores do Quilombo ergueram também uma capela em homenagem a São José Operário, padroeiro da comunidade, onde uma vez por mês, um padre da Diocese de Valença celebra missa. E, mais recentemente, uma capela dedicada a Santa Bárbara; um sonho antigo da Mãe Tetê, que conseguiu realizar ainda em vida.

Aqui não existe preconceito. A gente sai do centro de umbanda e vai para a missa na capela. Afinal de contas, o nosso Deus é um só”, uma vez falou, bem-humorado, Antônio do Nascimento, o “Toninho”, filho de Zeferina.

No dia 1º de maio, dia consagrado a esse santo, eles realizam uma grande festa no quilombo, onde é celebrada uma missa afro na capela da comunidade, rodas de capoeira, campeonatos de futebol, feijoada, e, como não podia faltar, muito jongo e calango até o sol raiar.  Esses eventos vêm atraindo uma grande quantidade de turistas que aumenta a cada ano.

Devido ao sucesso dessa festa os moradores de São José passaram a realizar um outro grande evento no segundo semestre.

Fora isso são comemorados também casamentos, batizados, aniversários, na umbanda o dia dos pretos-velhos, dia de São Cosme e Damião, o Ano-novo e o Dia de Iemanjá (31 de dezembro), dia de Nossa Senhora das Candeias, quando Mãe Zeferina acendia uma candeia no terreiro em homenagem à santa, festas onde é rezado e cantado o Terço de São Gonçalo como pagamento de promessas, entre outras.

A festa é o momento de congregação da família e dos amigos e celebração da memória dos ancestrais.

Viva o Quilombo São José!

* Texto Marcos André Carvalho (originalmente escrito em 2024 e revisado em 2024)

GENEALOGIA

Tertuliano e Miquelina foram escravos na Fazenda de São José da Serra no interior do atual estado do Rio de Janeiro, principal área de produção de café do Brasil na primeira metade do século XIX. Nessa época, a região reunia uma população escrava majoritariamente formada por africanos falantes de línguas banto, enviados ao Brasil pelos portos negreiros da costa do Congo e de Angola e também da chamada contra-costa (Moçambique).

Pedro e Militana foram vendidos da Bahia para a mesma região, com um filho pequeno chamado Manoel, em meados do século XIX. Pedro era africano de nação Cabinda, conforme contava seu neto, Manoel Seabra.

Seus netos, bisnetos e tataranetos formam hoje a “comunidade de São José da Serra”, grupo de parentesco que constrói a herança imaterial de seus antepassados, bem como a relação com o território que ocupa há mais de cem anos, a partir da memória do cativeiro na Fazenda São José da Serra e da abolição da escravidão, em particular.

Guardiães da memória do grupo, os irmãos Zeferina (falecida em 2003) e Manoel Seabra nasceram na Fazenda na década de 1920. Gravaram depoimentos para o projeto Memórias do Cativeiro do Laboratório de História Oral e Imagem da Universidade Federal Fluminense (LABHOI), em 1995 (D. Zeferina), 1998 (Seu Manoel) e 2003 (Seu Manoel). Falaram da geração de seus pais, nascida pouco antes ou logo após a abolição, em finais do século XIX (os chamados “ventres livres”) e de seus avós, nascidos antes de 1871, quando foi promulgada a Lei Rio Branco ou Lei do Ventre Livre.

Em 2003, a equipe do LABHOI fez novas entrevistas com companheiros de geração de D. Zeferina e Seu Manoel (Lorentina, irmã de ambos e as irmãs Maria Santinha e Joana Sarapião), bem como com alguns membros da geração seguinte, entre eles Antônio Nascimento Fernandes e sua irmã Dona Terezinha, que substituiu a mãe como líder espiritual da comunidade. Foi com base nesse conjunto de entrevistas confrontadas aos livros de batismo e casamento da paróquia de Santa Isabel do Rio Preto que complementamos a genealogia do grupo.

Com este procedimento, foi possível constatar que os atuais moradores da comunidade de São José são praticamente todos descendentes de um único casal de escravos, de nome Tertuliano e Miquelina, casados “segundo o rito romano”, moradores na Fazenda São José da Serra, de propriedade (terras e escravos) de José Gonçalves Roxo, na década de 1860. Atualmente, em todas as casas, pelo menos um morador descende de um dos filhos de Tertuliano e Miquelina, que se apresentam como o elo de ligação do grupo com o território da antiga fazenda.

Fotografia Bruno Veiga

Tertuliano e Miquelina, escravos de José Gonçalves Roxo, e, depois de 1871, de seus herdeiros, registraram o batismo de cinco filhos na Paróquia de Santa Isabel do Rio Preto: Dionísio (20/05/1866), Geraldo Preto (3/04/1870), João e Maria, gêmeos, (17/04/1881) e Vitalina Preta (20/10/1885). Dionísio casou-se com Zeferina ( filha de Paulina, escrava de Francisco Antônio Martins, batizada em 27/08/1870 ) em 25 de maio de 1889, já libertos e ainda citados sem sobrenome. A primogênita do casal, de nome Brandina, viria ser a mãe de Seu Manoel e D. Zeferina. 

Geraldo Preto também se casou em 1889, em 28 de setembro, com o sobrenome de Geraldo Fernandes, com Apolinária da Conceição, filha natural de Francisca Rosário da Conceição, que viriam a ser os pais de José Geraldo Fernando, o avô Geraldo, lembrado com carinho e respeito no depoimento dos netos Toninho, Elizabete e Terezinha de Jesus. Casado com Maria Crescença gerou Sebastião Fernandes que viria a casar-se com sua prima D. Zeferina. 

Já Seu Manoel Seabra recebeu no batismo o nome do pai ( Manoel ) e o sobrenome do avô ( Pedro Costa Seabra ), que, segundo as narrativas, está ligado a seu primeiro local de residência como cativo no Brasil, vindo da Costa da África. Manoel casou-se com Maria Vitalina, filha de João Roberto e Vitalina Miquelina da Conceição, esta, a Vitalina Preta, filha mais nova de Tertuliano e Miquelina. 

Entre os atuais moradores do quilombo, além dos descendentes de Brandina e Manoel e os de José Geraldo e Maria Crescença, há ainda as irmãs Santinha e Joaninha Sarapião com seus filhos e netos, ambas octogenárias, filhas de Maria Francisca e José Sarapião Ferreira. Segundo os depoimentos de Seu Manoel Seabra e de Maria Santinha esta Maria Francisca é filha de Tertuliano e Miquelina, nascida em 1881.

* Texto Hebe Maria Mattos 

DEPOIMENTOS

Segundo Dona Zeferina e Seu Manoel, o avô materno de ambos chamava-se Dionísio e a avó Zeferina, de quem a neta herdou o nome, ambos já nascidos “ventre-livres” na Fazenda São José da Serra. A mãe, Brandina, era a mais velha de 15 irmãos. 

Dionísio e Zeferina moravam nas terras da São José, na qual plantavam milho e feijão e onde tinham criações de porcos e galinhas. A organização familiar do trabalho, embasada numa forte autoridade paterna, é bastante enfatizada pelos netos, ao se lembrar das queixas de sua mãe sobre a severidade do velho Dionísio. Além do milho e do feijão, que plantavam para si nas terras da São José, o pai e os filhos para isso recrutados (especialmente os homens) trabalhavam de segunda a sábado, por empreitada, nos cafezais presentes nesta e em outras fazendas da região. 

O pai de Zeferina e Manoel era da mesma geração que o velho Dionísio. Chamava-se Manoel, como o filho, e era quase trinta anos mais velho que sua esposa Brandina. Manoel teria chegado à Fazenda São José, “ventre livre”, ainda bebê de colo, comprado da Bahia, juntamente com seus pais, o africano Pedro e a baiana Militana. Os netos não os conheceram, mas ouviram o pai contar que Pedro e Militana teriam falecido, com mais de noventa anos, ainda trabalhando em suas roças na Fazenda São José. 

Morreram antes d’eu conhecer. Disse que eles eram muito velhinhos e ainda trabalhavam. Trabalhavam com a enxadinha deles. Nunca pararam de trabalhar. Parou, bem dizer, no final da semana que ele parou de trabalhar que ele morreu. Limpava a beira da casa todinha, plantava cana, feijão”(D. Zeferina)

Manoel e Brandina foram pais de 15 filhos nascidos na Fazenda São José. Coincidentemente Manoel e Zeferina, que herdaram o nome do pai e da avó, nela permaneceram com a maioria de seus descendentes. 

Segundo Dona Zeferina, também seu marido e primo, Sebastião Antônio Fernandes, foi nascido e criado na antiga fazenda, filho de José Geraldo e Maria Crescença, “ventre-livres”, ele, filho de um outro Geraldo, irmão de seu pai Dionísio, também nascido escravo na São José, ela, chegada ainda mamando, com sua mãe Crescença, que contava ter sido comprada como cativa de uma outra região, separada de dois filhos mais velhos.  

Desta forma, a memória familiar de D. Zeferina organiza claramente três gerações definidas por relações com o cativeiro e o território da Fazenda São José: a geração dos “cativos” (seus avós), a geração dos “ventre-livres” (seus pais) e a dela (os atuais guardiões da memória da comunidade). 

Negro no cativeiro. Passou tanto trabalho. Ganhou sua liberdade. No dia 13 de maio, diz a letra de um dos jongos cantados pela comunidade nas festas que, segundo o depoimento de Dona Zeferina, em 1995, já duraram vários dias, em comemoração ao 13 de maio.  

A Constituição brasileira de 1988 reconheceu o direito à terra aos grupos classificados como “remanescentes de quilombos”, estendendo a classificação às comunidades de camponeses negros descendentes de escravos com posse tradicional da terra que ocupavam. Em 1998, a comunidade de São José da Serra foi assim oficialmente reconhecida.  

Os filhos de Tertuliano e Miquelina, todos nascidos na Fazenda de São José da Serra quando eram, escravos e terras, propriedade de José Gonçalves Roxo, são os ascendentes diretos dos moradores do novo quilombo. Seus descendentes ali permaneceram, por mais de cem anos e apesar dos diferentes proprietários legais da fazenda. 

Como outros grupos identificados como remanescentes de quilombo no estado do Rio de Janeiro, eles, de fato, atualizam e dão visibilidade a antigas organizações informais, fundadas no parentesco, que garantiram direitos costumeiros de acesso à terra aos seus antepassados ainda enquanto escravos

Como na letra do jongo, Tertuliano e Miquelina parecem nos perguntar O que é que faz o negro / Na fazenda do Senhor /O senhor mandou embora / Por que é que o negro voltou?

* Texto Hebe Maria Mattos

PROJETOS CULTURAIS E SOCIAIS

Agricultura familiar – todos os moradores do Quilombo ainda são agricultores preservando os saberes herdados dos ancestrais escravos que trabalhavam nas lavouras da fazenda São José.  O trabalho agrícola na comunidade é todo realizado em sistema de mutirão. Os jovens se revezam no trabalho das hortas dos idosos auxiliando-os no trabalho. Até os idosos de 90 anos fazem questão de continuar trabalhando na terra. A comunidade busca agora financiamento para ampliar e distribuir a produção agrícola gerando renda para os moradores locais. 

Museu do Jongo –

Centro de Ensino e Cultura Mãe Zeferina do Nascimento – a Associação de Moradores local está implementando o Centro para o desenvolvimento de projetos culturais e sociais como o Centro de Memória, Sala de Artesanato, Estúdio Digital de Áudio e Vídeo, Sala de Informática, Sala de Dança e de Música entre outros. 

Escola de Jongo do Quilombo São José – Criança Esperança – TV Globo e UNESCO

Ponto de Cultura Núcleo de Cultura Popular do Vale do Paraíba – Quilombo São José – Ministério da Cultura

Projeto Tempo livre – SESC Rio de Janeiro

CD-livro Quilombo São José – SESC Rio de Janeiro

Festa do dia 13 de maio de 2006 – NATURA

11º Encontro de Jongueiros  – PETROBRÁS 

CD Jongos do Brasil

CALENDÁRIOS DE FESTAS

13 de maio – Dia dos Pretos-Velhos – Principal festa do ano no Quilombo São José. 

Ela começa de manhã com uma missa afro, seguida de um almoço comunitário incluindo a tradicional feijoada.

Após o almoço começam as apresentações de diversos grupos de cultura popular da região do Vale do Rio Paraíba dentre eles: Jongo de Pinheiral, Folia de Reis de Valença, Jongo de Barra do Piraí, Jongo de Angra dos Reis, Jongo de Quissamã, Jongo de Porciúncula, Capoeira de Valença entre outros. 

No cair da noite, na hora de acender a fogueira acontece a tradicional “Benção da Fogueira” realizada pela Mãe Tetê, líder espiritual do quilombo, seguida de uma roda de jongo com o Jongo do Quilombo São José, anfitrião da festa. 

Em seguida é realizado um baile de calango, tradicional gênero da região, cantado de improviso ao som de uma sanfona, cavaquinhos, pandeiros entre outros.

Ao longo da madrugada o baile de calango é intercalado com rodas de jongo na beira da fogueira até o sol raiar.

São comuns apresentações dos cantores Luciane Menezes e Marcos André que costumam realizar rodas de ciranda, coco e outros gêneros da cultura popular. Na fogueira os festantes assam batata doce e conversam a vontade.

Dezenas de barracas de camping são armadas no campo verde.

No raiar do dia são cantados os jongos para sarava a barra do dia e após o café da manhã com aipim cozido ainda tem jogo de futebol.

A festa do Quilombo é uma das mais autênticas do país. Lembra os tempos antigos.

No dia 13 de maio, dia consagrado as almas benditas dos pretos-velhos, também é servido o mingau das almas.

Festa de outubro – Com o sucesso das festas de maio que vem atraindo cerca de 3.000 turistas estrangeiros, de diversas regiões do Brasil e da redondeza a comunidade passou a realizar uma segunda festa aberta ao público no segundo semestre, geralmente em outubro. 

Festas de jongo comunitárias – A comunidade faz questão de preservar as festas comunitárias fechadas somente para os familiares e amigos mais próximos como as que sempre existiram antes do Quilombo ficar conhecido. 

Giras de Umbanda – A comunidade tem dois terreiros de umbanda. Um dentro do Quilombo São José e outro em Santa Isabel do Rio Preto, cidade vizinha ao Quilombo. As festas do Terreiro do Quilombo são fechadas ao público. As do Terreiro do Morro do Cruzeiro, na cidade vizinha de Santa Isabel, ocorrem sempre no segundo sábado do mês e são abertas ao público contando com a presença de toda a comunidade.

Mãe Zeferina do Nascimento era a mãe-de-santo do Quilombo. Depois da sua morte, a sua filha Teresa, a Mãe Tetê, se tornou a líder espiritual do Quilombo. Mãe Tetê faleceu em junho de 2022, sendo substituída nesta função por Maria da Paz.

Na umbanda do Quilombo são cultuadas as entidades dos pretos-velhos, os caboclos, as criança, o povo de rua, Xangô, Ogum, marinheiros, baianos entre outros.

27 de setembro – Dia de São Cosme e São Damião – Festa das Crianças. É realizada uma gira de umbanda em homenagem as almas das crianças. São distribuídos doces, refrigerante e um bolo enorme que é repartido para quase duzentas pessoas. São incorporadas as entidades das crianças que fazem uma grande algazarra e sujam a todos de doces. Todos ficam como se fossem criancinhas. Os médiuns do terreiro e seus parentes distribuem doces caseiros para as crianças. 

BENS CULTURAIS LOCAIS

Calango – Baile tradicional ao som da sanfona de oito baixos e de pandeiros. Os cantadores cantam de improviso se desafiando um ao outro. É uma grande prova de inteligência e habilidade mental. A resposta tem que ser criadas na hora.  Ocorrem nas festas de jongo, casamentos e festas comunitárias no salão do Centro Comunitário ou numa barraca de bambu armada na porta da casa do festeiro.

Terço de São Gonçalo – realizado como forma de pagamento de promessas. O terço é cantado em agradecimento a São Gonçalo em um altar decorado na porta da casa do pagador da promessa. Após o terço, acontece uma roda de jongo e um baile de calango.

Jogo do CaceteO Tio Manoel Seabra foi um dos últimos detentores deste saber. Uma dança de duplas na qual cada um carrega um bastão bem comprido na mão. Perde quem leva a cacetada. 

Pedreira de Xangô – No alto do Quilombo ao lado do antigo e enorme Jequitibá de mais de cem anos existe uma pedreira muito grande consagrada a Xangô. Em maio fica rodeada por milhares de margaridas amarelas.  

Jequitibá – árvore com mais de 100 anos que fica no ponto mais alto da comunidade perto da pedreira de Xangô. Símbolo de resistência para os quilombolas que atravessaram anos sem sair da terra. No pé do jequitibá existe uma gruta onde são depositadas oferendas para entidades espirituais. 

Telhado de Sapê – Os telhados das casas do Quilombo são feitos de um trançado feito com sapê, uma espécie de palha, usado na cobertura das casas de barro da comunidade. O trançado é um saber passado de geração em geração. O Quilombo São José é um dos raros lugares no Brasil onde ainda existe essa técnica que veio da região Congo-Angola da África com os negros durante a escravidão preservada até os dias de hoje na comunidade. 

Casa de Tijolos Adobe – as casas do Quilombo ainda são feitas com o mesmo padrão da época da escravidão. As paredes são feitas de um tijolo feito de barro chamado de “adobe”. 

Tambu – é sinônimo de tambor de jongo. Os dois tambus do Quilombo, o candongueiro e o caxambu, são feitos de um tronco único de árvore escavado a fogo. Uma das extremidades é recoberta com uma pele de animal presa ao tronco com pregos. Uma alça presa ao corpo do tambu permite carregá-lo no ombro, enquanto o tocador anda podendo ainda tocá-lo enquanto se desloca. Toninho Canecão conta que a técnica de se fazer tambu era secreta e que o “nego-velho” saía para mata para procurar o tronco adequado e Iá mesmo escondido o fabricava escavando o tronco com o fogo.   Já chegava com o tambu pronto para se tocar sem ninguém aprender como se fazia.

informações

Jongo Quilombo São José da Serra – Valença/RJ

Estrada da Fazenda São José da Serra, Santa Isabel do Rio Preto, Valença/RJ

Como chegar:
O Quilombo São José fica na Serra da Beleza, a 560 metros acima do nível do mar, entre as cidades de Conservatória e Santa Isabel do Rio Preto, localizadas no município de Valença/RJ. Saindo da Dutra, o visitante tem duas opções para chegar ao Quilombo São José: a primeira é passando por Piraí e Conservatória. A segunda opção é passando por Volta Redonda(em direção ao bairro Voldac) e pelas cidades de Amparo e Santa Isabel, sentido Conservatória. Ao chegar na placa Quilombo São José, o visitante deverá pegar a estrada de terra secundária e seguir por cerca de 5km.

Contato:
Amauri Fernandes – (24) 99302.8494

BIOGRAFIA

MÃE ZEFERINA

* por Toninho Canecão

Mãe Zeferina sofreu muito quando menina. Sua mãe Brandina foi para Nova Iguaçu com o fim das lavouras de café e a falta de serviço aqui na região. Alguns parentes de Vó Brandina tinham ido colher laranja na Baixada Fluminense deixando duas meninas aos cuidados do seu irmão mais velho João Seabra, que era casado. Tanto ele quanto sua mulher eram muitos rigorosos, cobravam muito de minha mãe e sua irmã Francelina, que sempre estava em sua companhia. 

Fotografia Marcos André Carvalho

Naquele tempo os mais velhos eram muito rigorosos com as crianças e gostavam de empregar alguns castigos. Tio João plantava muito arroz e tinha que tomar conta dos passarinhos para que eles não arrancassem a plantação. Só que para as crianças cumprirem essa tarefa custava muito caro, pois elas tinham que se levantar bem antes do dia amanhecer. 

Naquele tempo a roupa usada pelo negro era de saco, que era cortado no local dos braços e da cabeça. Era uma peça do vestuário tanto dos meninos quanto das meninas. Eram dois sacos, um para usar durante a semana e outro para vestir no dia de domingo. Só tínhamos duas mudas de roupa cada. Nos dias de chuva, as roupas eram postas na boca do fogão de lenha para secar.

Com chuva ou sol, Mãe Zeferina estava sempre na plantação tomando conta dos passarinhos, que insistiam em arrancar arroz. Se o passarinho mexesse em alguma coisa aquilo lhe custava uma surra. 

O café da manhã era um pedaço de cana que Mãe Zeferina ia chupando em direção ao arrozal.  Almoço só pela tarde quando a esposa do seu irmão João lembrava que tinham duas crianças com fome. Até que um dia a dona da fazenda descobriu que as duas meninas estavam sendo mal tratadas, e logo mandou chamar seu João e exigiu que ele entregasse as meninas. Por motivo que eu não sei, só minha Mãe Zeferina acabou ficando na Fazenda São José, de propriedade da família Ferraz.

Lá, veio a gostar do meu pai Sebastião, mas a dona não deu autorização para o casamento. Como Vó Brandina ainda estava morando longe e o Tio João já havia se mudado da região, Mãe Zeferina obteve autorização para o casório com o Tio Manoel Seabra.

A patroa não queria aceitar o casamento de jeito nenhum, pois minha mãe só tinha um pouquinho mais de 15 anos e o Tio Manoel também era menor de idade, mesmo assim casaram-se.

Se não fosse este ato de bravura do Tio Manoel Seabra eu não estaria aqui contando essa historia para vocês.

Mãe Zeferina, casada e mãe de 12 filhos lindos viveu com meu pai Sebastião por longos e felizes anos.  Meu avô Sebastião, gostava de ser tratado e era conhecido como Zequinha.

Apesar de muita coisa ruim que acontecia, a gente era muito feliz.

Na infância Mãe Zeferina trocava sua hora de folga por algumas horas de aula por semana para aprender a ler. Quando cresceu, tornou-se a primeira professora na comunidade. Aqueles anos em que trabalhou com a dona da fazenda foram o bastante para ela poder aplicar todo aquele aprendizado na comunidade. Colocava alguns bancos na sala de minha casa e lá ensinava boa parte de nós. Assim todos sabem assinar seu próprio nome e ler algumas coisas.

Museu do Jongo do Quilombo São José

Estrada da Fazenda São José da Serra, Santa Isabel do Rio Preto, Valença/RJ

Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José
Museu do Jongo do Quilombo São José

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